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Juiz de garantias: veja perguntas e respostas sobre o tema

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, suspendeu nesta quarta-feira (15) por 180 dias a aplicação do juiz de garantias, previsto no pacote anticrime aprovado no Congresso Nacional. Desde que a proposta foi sancionada, o tema gerou discussões entre juristas, advogados, procuradores, magistrados e outros especialistas. As questões sobre a nova figura a atuar no processo penal giram em torno da aplicação do instituto: se será preciso, por exemplo, criar mais cargos para atender a demanda nos estados; se a medida é aplicável em todas as instâncias, e se vale para processos já em andamento. O G1 preparou um texto no formato de perguntas e respostas com o que se sabe até o momento sobre o juiz de garantias. O que é o juiz de garantias? O processo penal no Brasil passará a contar com a participação do juiz de garantias, um juiz de direito que, segundo a legislação, estará encarregado do “controle de legalidade da investigação criminal” e da “salvaguarda dos direitos inpiduais”. Na prática, este juiz vai atuar na fase de investigação de crimes, quando forem necessárias decisões judiciais para procedimentos que vão ajudar a polícia e o Ministério Público a desenvolver as investigações. O juiz de garantias foi instituído pela lei do pacote anticrime, aprovado em dezembro pelo Congresso Nacional. Para fazer isso, os parlamentares incluíram seis artigos no Código de Processo Penal, a norma que orienta a tramitação de processos penais no país. Em quais situações o juiz de garantias poderá atuar? A lei estabelece uma lista de 18 situações em que o juiz de garantias vai atuar: receber a comunicação imediata da prisão de um suspeito; receber o auto da prisão em flagrante para verificar foram cumpridos os requisitos previstos em lei para a prisão;zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que este seja conduzido à sua presença, a qualquer tempo;ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal;decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida cautelar;prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, substituí-las ou revogá-las;decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas consideradas urgentes e não-repetíveis (provas que não podem ser produzidas novamente, como um exame de corpo de delito);prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado preso;determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento;requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação;decidir sobre os requerimentos de: pedidos de quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico de investigados; mandados de busca e apreensão para alvos de apurações; acesso a informações sigilosas; julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia;determinar a instauração de incidente de insanidade mental (instaurado sempre que houver dúvida sobre a saúde mental do acusado e para verificar se, à época dos atos, ele era ou não inimputável);decidir sobre o recebimento da denúncia do Ministério Público ou queixa de vítimas; permitir ao investigado e ao seu defensor de acesso a todos os elementos informativos e provas produzidos na investigação criminal;deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a produção da perícia;decidir sobre a homologação de acordo de não-persecução penal ou os de colaboração premiada, quando formalizados durante a investigação; Na última hipótese, o texto da lei determina que o juiz de garantias vai atuar em "outras matérias inerentes às atribuições definidas" pelo conceito de juiz de garantias (atuação no controle de qualidade e na garantia de direitos inpiduais). Este trecho do texto deixa claro, portanto, que o rol de atribuições do juiz de garantias não é exaustivo, ou seja, não se esgota no que está estabelecido na letra da lei. Novas atribuições podem ser reconhecidas, por exemplo, na jurisprudência de tribunais, na análise de casos concretos. O juiz de garantias vai atuar na fase de investigação de quais crimes? Pela lei, a atuação do juiz de garantias abrange todas as infrações penais, exceto crimes de menor potencial ofensivo (com penas de até dois anos) e contravenções penais. E vai ser encerrada com o recebimento da proposta de ação penal (denúncia ou queixa). Outro magistrado vai tratar do processo após a ação penal, até a sentença. Quando deve entrar em vigor o juiz de garantias? A previsão inicial era de que a medida começaria a valer no dia 23 de janeiro, quando também entra em vigor a lei do pacote anticrime, com mudanças na legislação penal e processual penal. Mas a decisão do ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), adiou os planos iniciais. Como será implantado o juiz de garantias? Em dois pontos, a lei cita a questão da forma como será implantado o juiz de garantias - mas não traz detalhes. A nova regra diz que, nas "comarcas em que funcionar apenas um juiz, os tribunais criarão um sistema de rodízio de magistrados". Mas especialistas, advogados, procuradores, juízes e juristas têm dúvidas de como será implantado esse rodízio. Em outro trecho, a norma afirma que o "juiz das garantias será designado conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente pulgados pelo respectivo tribunal". As normas de organização judiciária são aquelas que detalham a estrutura e o funcionamento dos órgãos do Poder Judiciário. São definidas em leis estaduais e em regimentos internos de tribunais. Por isso, ainda em dezembro do ano passado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou a criação de um grupo de trabalho para a análise de formas de implementação do juiz de garantias. O grupo de trabalho abriu consulta pública e recebeu 111 sugestões até esta quarta. Entre as instituições que enviaram propostas estão a Procuradoria-Geral da República (PGR), a Defensoria Pública da União (DPU), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Asssociação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Magistrados e tribunais federais e estaduais também contribuíram com os trabalhos. Quantas ações tramitam no Supremo Tribunal Federal sobre o tema? Até o momento, três ações contestam o juiz de garantias no STF: a primeira foi apresentada pela Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) e da Asssociação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe); a segunda, pelos partidos Podemos e Cidadania; e a terceira pelo Partido Social Liberal. A decisão do ministro, em caráter liminar, atendeu aos pedidos das três, no sentido de que fosse suspensa a entrada em vigor da medida. O plenário do STF vai analisar ainda o mérito (conteúdo) das ações, em julgamento com data ainda a ser definida. Quais os principais pontos da medida considerados inconstitucionais pelas ações apresentadas ao STF? As três ações no STF especificam os pontos que consideram inconstitucionais na implantação da figura do juiz de garantias. São elas: Vício de iniciativa: a criação do juiz de garantias deveria ocorrer por proposta de lei de iniciativa dos tribunais, e não dos parlamentares. Ou seja, não houve respeito ao processo legislativo previsto na Constituição; Violação do princípio do juiz natural: o princípio do juiz natural, previsto na Constituição, prevê que "ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente". Ou seja, é uma garantia a quem é processado em uma ação penal de que seu caso será analisado por um juiz cuja competência para atuar no seu processo foi estabelecida previamente em lei. A intenção é evitar que, para um determinado processo, as partes possam escolher ou excluir determinado magistrado. Violação do princípio da igualdade: o entendimento, neste ponto, é de que, como o juiz de garantias não será aplicado a ações nos TJs, TRFs, STF e STJ, haverá uma diferença de tratamento para processos na primeira instância e em procedimentos iniciados em outras instâncias. A ação da AMB e da Ajufe exemplifica: ”Um Deputado Federal, detentor da prerrogativa de foro, que estiver sendo investigado perante esse STF por crime praticado no exercício da função e em razão da função, não terá direito ao Juiz das Garantias, mas esse mesmo Deputado Federal, estando sendo investigado por qualquer outro crime perante a 1ª instância, fará jus ao juiz das garantias”Criação de despesas sem a fonte de custeio prevista: a criação do juiz de garantias, na avaliação das ações apresentadas ao STF, vai implicar em aumento de custos. Com isso, há uma violação ao artigo da Constituição que estabelece que qualquer criação de cargos e novas despesas deve ter, previamente, a indicação da fonte dos recursos para custeio e autorização na Lei de Diretrizes Orçamentárias. Retroatividade da lei processual penal: segundo o Código de Processo Penal, a lei processual penal tem aplicação imediata. Há a avaliação, no entanto, de que pode haver uma aplicação retroativa indevida da lei, se a lei incidir em casos em tramitação. Nesta situação, o juiz que atua no processo já em andamento poderá ser impedido de atuar na fase posterior, após o início da ação penal. Violação do princípio da proporcionalidade: a violação ocorreria por conta do prazo de 30 dias para a entrada em vigor do juiz de garantias. O prazo é menor que os seis meses para a entrada em vigor, se aprovado, do novo Código de Processo Penal. Violação do princípio da duração razoável do processo: há ofensa ao princípio da duração razoável do processo, defendem as ações, porque o juiz responsável pela ação penal não vai acompanhar o desenvolvimento das investigações, o que pode ocasionar um julgamento mais tardio. O que disse quem defende a lei? A Ordem dos Advogados do Brasil defendeu a lei em manifestação ao STF. A OAB considerou que o juiz de garantias "não viola qualquer dispositivo constitucional, em não se tratando da criação de um novo órgão do Poder Judiciário Nacional, persamente do que aponta a petição inicial". A OAB acrescentou: "Eventuais problemas ou dificuldades práticas de implementação do juiz de garantia não torna a regra inconstitucional e são plenamente solucionáveis em um curto período, desde que haja vontade na necessária – e já tardia - implementação do juiz de garantias". Em manifestação ao Conselho Nacional de Justiça, a Defensoria Pública da União (DPU) afirmou: "A separação entre juízo das garantias e juízo processante (juicio oral) ainda impede a contaminação do órgão julgador do mérito por elementos investigativos dos quais não pode nem deve ter conhecimento." "Esse incremento técnico não decorre da desconfiança em relação à pessoa do juiz, mas do esclarecimento jurídico-científico segundo o qual a imparcialidade não é um atributo subjetivo ou personalíssimo do julgador, mas uma equidistância argumentativo-contraditorial que o terceiro desinteressado, por isso legítimo decisor, precisa manter em relação aos interessados (partes) no caso", prossegue a DPU. Vale para procedimentos do tribunal do júri e crimes da Lei Maria da Penha? Esta pergunta também não tem uma resposta definitiva. Nos documentos com sugestões enviados ao CNJ, algumas instituições sugeriram que o juiz de garantias não seja aplicado para processos específicos, como aqueles realizados no Tribunal do Júri e nos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Pela Constituição, o tribunal do júri julga os chamados crimes dolosos contra a vida - o mais conhecido é o homicídio. Já a Lei Maria da Penha deu a competência aos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para o processo, julgamento e execução de causas cíveis e criminais relacionadas à violência doméstica contra a mulher. Como será implantada a medida nas comarcas com um juiz? Assim que foi sancionada a lei, associações de juízes, procuradores, além de juristas e especialistas apontaram questionamentos sobre o funcionamento do juiz de garantias em comarcas com um juiz. A lei estabelece que, nestas situações, será feito um rodízio - mas não traz outros detalhes. As instituições que enviaram informações ao CNJ enfrentaram a questão, apresentando sugestões para o tema. Na instalação do grupo de trabalho para análise da implantação do juiz de garantias, o coordenador do grupo, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Humberto Martins, apresentou dados sobre a estrutura da primeira instância no país. "Na justiça estadual, cerca de 21,4% do total dos processos em tramitação na fase de conhecimento [inicial] são criminais. Na justiça federal, esse número é de cerca de 3,8%. Além disso, em ambos os segmentos, as varas únicas representam quase 20% do total das unidades judiciárias e correspondem a 60% do total de localidades. Esses números mostram bem a dimensão da tarefa que é estruturar o juízo das garantias em todo o território nacional", disse. O grupo de trabalho do CNJ está elaborando um estudo sobre as formas de implantação do juiz de garantias nas comarcas com um juiz. Este estudo deve orientar a implantação da medida nos tribunais. O tema também deve voltar a ser discutido quando o Supremo Tribunal Federal discutir o mérito das ações que questionam a constitucionalidade da medida. O juiz de garantias vale para processos em andamento ou só para novos casos? Outra pergunta para a qual não há uma resposta definitiva. As instituições que apresentaram sugestões sobre o juiz de garantias ao CNJ apontaram questionamentos sobre o assunto. O Congresso já discutiu, em ocasiões anteriores, a possibilidade de criação de juiz de garantias? Sim. O tema foi levantado, por exemplo, quando o Senado discutiu a proposta de novo Código de Processo Penal. O projeto foi aprovado em 2010 pelo Senado e seguiu em 2011 para Câmara. O texto do Senado de 2009 tem semelhanças com o texto aprovado em 2019 na Câmara. Em 2010, durante a tramitação do projeto no Senado, o CNJ chegou a pulgar nota técnica com críticas à medida. "A consolidação dessa ideia, sob o aspecto operacional, mostra-se incompatível com a atual estrutura das justiças estadual e federal", afirmou o conselho na ocasião. "Ademais, diante de tais dificuldades, com a eventual implementação de tal medida haverá riscos ao atendimento do princípio da razoável duração do processo, a par de um perigo iminente de prescrição de muitas ações penais". O Congresso pode mudar a lei do juiz de garantias? As ações que contestam o juiz de garantias no STF apontam que, pela Constituição, é preciso lei de iniciativa dos tribunais para alteração de leis que tratam da estrutura judiciária. Ou seja, estas ações consideram que não caberia ao Congresso a iniciativa de lei para a criação e instituição do juiz de garantias. O STF também deve se debruçar sobre o tema, ou seja, deve debater a quem cabe a iniciativa deste tipo de projeto. De qualquer forma, a discussão pode voltar a ocorrer na Câmara, no âmbito da comissão especial que analisa o novo Código de Processo Penal, proposta vinda do Senado. Projetos pontuais de deputados e senadores também podem surgir, na esteira da polêmica sobre o juiz de garantias. O modelo do juiz de garantias já é adotado no Brasil e em outros países? Defensores do juiz de garantias lembram que o Departamento de Inquéritos Policiais, na Justiça de São Paulo, como um modelo próximo ao juiz de garantias. Já a AMB e a Ajufe discordam, por entenderem que os modelos do Dipo e da lei aprovada são diferentes. Há impacto financeiro na implantação da medida? Na votação na Câmara, o relator Lafayette Andrada (Republicanos-MG) votou pela adequação financeira e orçamentária da proposta - não mencionou, em seu parecer, a possibilidade de custos com a medida. No entanto, logo depois da sanção da matéria, especialistas citaram a possibilidade de que a medida implique em mais custos, por que pode criar demanda por mais cargos de juízes de Direito. Um dos pontos citados pelas ações que questionam o tema no STF é justamente a possibilidade de criação de novas despesas para os estados que não estão previstas na lei orçamentária. Qual impacto no tempo de tramitação dos processos? Não há uma estimativa na lei sobre este efeito. Ajufe e AMB, autoras de uma das ações no STF, ressaltaram que "dificilmente os inquéritos chegarão a um bom termo, em prazo razoável", por não haver juízes em número suficiente para atender a demanda.
15/01/2020 (00:00)

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